O ano é 2007 e o jogo em questão é futurista e tem a mecânica de tiro em primeira pessoa, mas sem a ação vista em títulos como Crysis e Call of Duty 4. Ao invés disso, o game investe na resolução de diversos quebra-cabeças, com o jogador sendo colocado como um rato de laboratório para experimentos executados por um robô maldoso e com um senso de humor ácido: este é Portal.
Título que chegou ao público como um joguinho desconhecido dentro de um pacote com nomes mais famosos da Valve, Portal ganhou o coração dos fãs com sua premissa diferenciada e uma vilã que todos amaram odiar. Mas como esse jogo tão excêntrico conseguiu chegar ao público e virar um clássico?
A ideia
Muito do que vemos em Portal vem de um jogo indie chamado Narbacular Drop. Desenvolvido por estudantes do DigiPen Institute of Technology, o game marcou presença na feira de profissões anual da universidade em 2005.
O jogo já trazia os elementos de portais e uma física bem desenvolvida, mas a trama era totalmente diferente. Em Narbacular Drop os jogadores controlavam a Princesa No-Knees, que seria capturada por um demônio e teria ajuda de um espírito da montanha para escapar da prisão, com o uso de portais mágicos.
A descoberta do título foi feita por Robin Walker, um dos desenvolvedores da Valve, que estava presente na feira e se interessou pelo jogo. Assim, Walker tratou de dar uma oportunidade para que os estudantes apresentassem seu jogo para a empresa.
Desenvolvimento
A apresentação foi um sucesso, surpreendendo até mesmo Gabe Newell, fundador da Valve, por conta de seu conceito e o uso da física. Isso foi o suficiente para que o grupo conseguisse um local para publicar seu jogo, mas com diversas mudanças criativas.
A Valve optou por mudar o foco narrativo para algo voltado para a ficção científica, por considerar que a história original era algo batido. Para isso, a equipe contou com a ajuda do escritor Marc Laidlaw, que fez com que o jogo fizesse parte do universo de Half-Life.
Com isso, a magia se tornou tecnologia, possibilitando a criação da “Portal Gun”. Oficialmente batizada de Aperture Science Handheld Portal Device (ASHPD), em homenagem a Adrian Shepard, protagonista de Half-Life: Opposing Force, a arma de portais viria a ser um dos itens mais icônicos do mundo dos games.
Durante o desenvolvimento, cerca de 10 pessoas trabalharam no jogo, com o primeiro ano sendo dedicado às mecânicas de gameplay. Mas o “grande problema” inicial foi desenvolver uma trama interessante com uma protagonista muda, visto que Chell não possui falas.
A antagonista
Neste momento, os roteiristas Erik Wolpaw e Chet Feliszek entraram em jogo para buscar uma solução. Com o conceito de uma inteligência artificial maligna sendo a antagonista, ambos trabalharam na personalidade e falas da robô.
E foi assim que GLaDOS nasceu. Possivelmente a IA mais icônica dos games, junto de Cortana, a grande vilã de Portal tem a motivação de testar a Portal Gun através de vários desafios nas instalações da Aperture Science.
Interpretada por Ellen McLain, a antagonista é considerada a alma do jogo com seu ótimo senso de humor e instintos assassinos. Prometendo um bolo caso o jogador vença todas as salas, a IA dá vida ao game, apesar de ser a única a se comunicar com Chell.
GLaDOS chega até a cantar em determinado momento do jogo, criando uma das cenas mais memoráveis da franquia.
Introspectivo demais?
Com apenas as falas de GLaDOS, a Valve logo percebeu que teria de caprichar na trilha sonora do jogo. Assim, o estúdio foi atrás de Kelly Bailey e Mike Morasky para trabalharem no jogo.
Bailey já havia trabalhado com a Valve anteriormente, como o principal responsável pelas trilhas da franquia Half-Life, enquanto Morasky estreou nos videogames em Portal. Uma curiosidade é que, apesar de estreante, Mike já havia trabalhado no mundo dos cinemas, com participação nos efeitos visuais de franquias como O Senhor dos Anéis, Matrix e Piratas do Caribe.
Lançamento e recepção
Apesar de ter agradado a Valve, a empresa optou por lançar o título como parte do pacote The Orange Box, disponível para PC, PlayStation 3 e Xbox 360. Além de Portal, a coleção incluía os jogos Half-Life 2, Half-Life 2: Episode One, Half-Life 2: Episode Two e Team Fortress 2.
Com a principal franquia da empresa “carregando” o pacote, Portal teve um lançamento seguro, com poucas chances de dar errado. Isto porque o jogo trazia um conceito inédito para o gênero FPS, o que não era comum da época.
Apesar de ser algo tão diferente, Portal foi um sucesso instantâneo de público e crítica. O jogo estreante, que foi lançado como um brinde, se tornou o maior destaque do pacote, alcançando a média de 90 no Metacritic.
Alguns dos pontos positivos mencionados pela crítica foram o sistema de física visto no jogo, além das mecânicas introduzidas pelo belo sistema de portais. Mas o principal destaque foi justamente o carisma e a presença de GLaDOS, que conduz a narrativa do jogo com com seus desafios e comentários extremamente bem colocados.
A personagem foi tão amada e/ou odiada pela comunidade de fãs que recebeu diversos prêmios como melhor personagem estreante dos games e até mesmo como melhor vilã dentre os apresentados em 2007. Portal também chegou a receber diversos prêmios de Jogo do Ano, como o Game Developers Choice Awards, o que fez com que o jogo se mantivesse no imaginário dos fãs, garantindo uma sequência.
O legado de Portal
Além de uma sequência, o amor da comunidade por Portal garantiu que a Valve publicasse o jogo de forma standalone. O jogo também foi disponibilizado para dispositivos Mac OS, para jogadores em computadores da Apple, e Linux, sistema operacional de código aberto.
Com o enorme sucesso, a Valve passou a vender diversos itens da franquia, incluindo até mesmo cosméticos de seus outros jogos. O grande destaque aqui é o pacote de narração de GLaDOS no Dota 2, MOBA desenvolvido pela empresa.
Atualmente, Portal figura como um dos melhores jogos de todos os tempos em diversas listas. Além disso, GLaDOS também é uma das maiores vilãs da história, de acordo com grande parte da crítica.